2025-09-17 10:55:37.0
Pesquisa da UFSCar confirmou que política influenciou mais que ciência na adesão às vacinas de Covid-19
Estudo avaliou dados de mais de 2 mil pessoas e foi publicado em revista internacional
Um estudo conduzido por pesquisadores do grupo Interfaces (https://www.interfaces.ufscar.br), ligados à Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), apontou que a lealdade política ao ex-presidente Jair Bolsonaro foi mais determinante para a hesitação vacinal contra a Covid-19 do que fatores tradicionalmente associados à desconfiança em vacinas, como religião, renda e educação. A pesquisa, pioneira, aplicou algoritmos da Inteligência Artificial para analisar as raízes do movimento antivacina no Brasil, e revelou que eleitores exclusivamente fiéis ao então presidente tiveram taxa de vacinação apenas de 65%, se comparado aos 71% daqueles dispostos a considerar outros candidatos.
A pesquisa analisou dados de 2.002 brasileiros, coletados em 2021, durante o auge da campanha de vacinação. Os participantes responderam questões sobre suas características demográficas (idade, gênero, educação, religião, renda e origem) e sobre suas percepções do governo Bolsonaro, intenções de voto para candidatos de diferentes espectros ideológicos e crenças específicas sobre a segurança das vacinas e tratamentos alternativos para Covid-19. "A desconfiança na segurança da vacina contra a Covid-19 era a razão primária para a hesitação, mas as raízes dessa desconfiança eram predominantemente políticas e ideológicas", descrevem os autores Sylvia Iasulaitis, do Departamento de Ciências Sociais da UFSCar; Alan Demetrius Vallejo, do Departamento de Computação, também da UFSCar; e Leonardo Ribeiro dos Santos, da Unicamp. Nesse aspecto político, o estudo indicou que entre eleitores de Bolsonaro dispostos a considerar outros candidatos de direita, a taxa de não vacinação ficou em 29%. Já entre aqueles que rejeitavam completamente outras opções conservadoras, esse número saltou para 39%. A taxa de vacinação entre este grupo mais fiel caía para apenas 65%, enquanto 35% expressavam recusa categórica em se vacinar.
Os pesquisadores também identificaram um ecossistema interconectado de crenças falsas, mapeando como a desinformação se propagou de forma sistemática. Exemplos disso são o caso de pessoas que acreditavam na eficácia do Kit Covid (medicamentos sem eficácia comprovada, disseminado pelo governo da época), na alteração de DNA que a vacina poderia provocar, no implante de microchips, causas de câncer, autismo, entre outros efeitos, que foram conteúdos de notícias falsas divulgadas na época da pandemia do coronavírus. Dentre os resultados demográficos, o estudo identificou que os homens tiveram menor interesse na vacinação do que as mulheres e que os mais jovens resistiram mais à aplicação da vacina. No que se refere ao quesito Educação, a vacina foi mais procurada por extremos - os analfabetos e os com Ensino Superior. Pessoas com renda mais baixa também tiveram menor adesão à vacina. No aspecto religioso, a pesquisa levantou que os evangélicos tiveram menor aceitação da vacina.
A inovação metodológica da pesquisa foi um destaque importante e apresentou a criação de "escore de partidarismo", que foi além da simples questão "em quem você votaria?". Os pesquisadores desenvolveram um sistema que capturou nuances de lealdade política utilizando técnicas de aprendizado de máquina. De acordo com os pesquisadores, o modelo final alcançou alta precisão, demonstrando a robustez estatística da investigação.
Um dos pontos principais do levantamento apoiam a reformulação da comunicação em saúde pública. "As estratégias tradicionais de comunicação sanitária, baseadas principalmente na divulgação de evidências científicas, podem ser insuficientes quando as atitudes são enraizadas na lealdade partidária. Fatores contextuais, especialmente o viés político, mostraram-se preditores mais significativos que variáveis socioeconômicas tradicionalmente consideradas", concluíram os pesquisadores.
Os resultados representam a primeira aplicação do aprendizado de máquina para mapeamento dos fatores políticos por trás da resistência vacinal do Brasil. Um artigo sobre a pesquisa foi publicado, recentemente, na revista científica Vaccine X, da Elsevier, e pode ser acessado neste link (https://bit.ly/4py9DpN).
Contato para esta matéria:
Gisele Bicaletto Telefone: (16) 33066595
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