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A2
Caderno:
Opinião
Texto na íntegra:
Uma palavra está muito presente nos diálogos travados em vários ambientes sociais atuais: cidadania. Ela ganhou enorme valor subjetivo e serve para validar ações individuais e coletivas, principalmente iniciativas de governos, corporações, organizações e movimentos sociais.

Contudo, ao observar a recorrência da utilização desse termo, percebe-se que ele traz sentidos variados, até mesmo, em alguns casos, antagônicos, tornando-se importante identificá-lo de maneira mais precisa.

A resposta à questão sobre o que é cidadania, realmente, não é simples, mas ela pode ser buscada na etimologia: a origem da palavra cidadania advém do latim "civitas", que significa cidade, o mesmo espaço e organização social que os gregos antigos identificavam por "pólis". Assim entendido o termo cidadania, cidadão (do latim) ou político (do grego) é o habitante da cidade.

As cidades atuais guardam semelhanças e diferenças com as cidades gregas antigas. Ambas são muito desiguais. Veja-se que na Grécia eram considerados cidadãos (homens, maiores de idade, nascidos na cidade e proprietários) apenas cerca de 5% dos habitantes, sendo que o restante (mulheres, crianças, estrangeiros e escravos) não tinha o direito à liberdade, à "isonomia" (igualdade perante a lei), à "isocracia" (igualdade de acesso a cargos públicos) e à "isegoria" (direito ao uso da palavra). A diferença reside no fato de que a minoria cidadã grega tinha o direito e o dever de participar na gestão da cidade; os que eram cidadãos e apenas se preocupavam com a vida pessoal eram identificado por "idion", termo do qual resulta a palavra idiota.

Assim, a etimologia e a história da cidadania indicam que: a) discutir cidadania significa dialogar sobre as relações que se estabelecem em uma organização social; b) cidadania refere-se à participação na definição dos rumos de um coletivo social. Destaque-se que não se deve desconsiderar do debate sobre a cidadania a indiferença política, pois ela também é uma forma de participação, uma vez que o idiota possibilita que outros definam os rumos da sua vida e da vida social.

A participação na vida social pode ocorrer de diferentes formas, do se conclui haver diferentes conceitos de cidadania. O primeiro deles é o que se assume como simples saber. Nesse caso, cidadão é o que conhece os direitos e deveres. Assim, torna-se um sujeito passivo, porque recebe pronto o que deverá cumprir, e a-crítico, pois não se pergunta quem, como e porque foram feitas as leis que normatizam a vida da coletividade. Considerando a cidadania como participação, pode-se dizer que esse conceito é o mais ingênuo porque acredita que conhecer é suficiente para ser cidadão.

Há o conceito de cidadania que se refere à posição do indivíduo nas relações de mercado, sendo o cidadão o incluído na sociedade de consumo. Este é o cliente, indivíduo que adquiriu posição na estrutura social conquistada pela "competência" no jogo do mercado. Considerando a cidadania como participação, esse conceito é funcional ao modo de vida social porque mobiliza iniciativas individuais e coletivas para "formar" sujeitos de acordo com as necessidades do mercado, cujos princípios residem no individualismo, na propriedade privada e na máxima moral de que a busca do bem estar individual resultará no bem estar coletivo.

O outro conceito é o de perspectiva "crítico-dialógica", que entende a cidadania como ação voluntária, sendo o cidadão o intérprete, interlocutor e ator na realidade próxima. É crítico porque tem o compromisso de superar as misérias que atingem a vida comunitária, local, e dialógico porque se aproxima dos indivíduos e organizações para com eles buscar a superação de problemas pontuais. Esse conceito tem limitado alcance social, pois o voluntariado visa a problemas pontuais e não estruturais.

O quarto conceito a ser mencionado é o de perspectiva "crítico-dialética", o qual entende por cidadania a ação transformadora das relações sociais globais. Segundo ele, cidadão é o "militante", aquele envolvido em processos de luta pela transformação das estruturas da realidade global, e não apenas local, e propositor de outras possibilidades de vida social.

Considerando que o cidadão, seja ele qual for, não nasce pronto, devendo ser "formado", torna-se dupla a tarefa dos que se interessam pela cidadania: a tarefa educativa e a política, isto é, ao mesmo tempo agir para "formar" cidadãos e interferir nos destinos da vida coletiva.
Gênero:
Artigo
Classificação:
UFSCar
Sub-classificações:
Artigos UFSCar - campus Sorocaba
Autor:
Marcos Francisco Martin
Palavras-chave:
Cidadania; Etimologia; Vida social;
Cidadania: uma palavra, muitos significados

Cruzeiro do Sul Sorocaba-SP em 2012-12-17 00:00:00.0 edição 32902
